Este livro é, indubitavelmente, um manual de consulta, “Socialmente Correcto” onde a teoria se funde com prática, e onde o passado se retrata na tentativa de um presente semelhante.
Lançado em Novembro de 1999, o livro da escritora Paula Bobone, licenciada em Filologia Germânica pela Universidade de Lisboa, conta já com mais de 12 mil exemplares vendidos. A autora deste livro, tem já publicada uma antologia de poesia portuguesa para a infância, colaborando com frequência em jornais e revistas de sociedade. “Socialmente correcto”, aborda regras comportamentais inseridas numa temática social que, ao longo das décadas, permitiu construir e solidificar, a sociedade na qual estamos inseridos. Numa escrita acessível, corrente e sem grandes construções gramáticas de carácter dúbio ou de difícil entendimento, Paula Bobone entra no universo do social, da tradição, da etiqueta, dos valores, tendo como pano de fundo a esfera cultural.
Este livro é, indubitavelmente, um manual de consulta, onde a teoria se funde com prática, e onde o passado se retrata na tentativa de um presente semelhante. “Socialmente Correcto“, é muito mais do que um conjunto de regras e boas maneiras. É a tentativa de fazer regressar o tempo, ao embrião dos séculos XV ou XVI, à época dos grandes luxos, das exageradas ostentações, das emblemáticas festas da corte, dos requintados chás, da beleza notável dos trajes dos nobres e burgueses. Esse tempo está muito longe de nós. Lembrado no pensamento, mas impossível de se colocar novamente na pirâmide do real.
Ao desfolhar atenciosamente o livro de Paula Bobone, uma palavra teima em aparecer sistematicamente: etiqueta. Mas, qual o seu verdadeiro significado? Para que serve realmente? A etiqueta é diferente da educação. A educação, não se transforma, não se altera. Os pais do século XV ensinaram os seus filhos a pronunciar a palavra “obrigado“, pelas mesmas razões que os pais do século XX. Isso não mudou. No passado e, actualmente, fomos ensinados a não dizer palavras obscenas (ainda que por vezes nos escapem), e esse ensinamento mantém-se.
As regras da boa educação estão definidas há já muito tempo, como se de um manual invisível se tratasse. Isto para salientar, que a educação ensina-se a todos, com mais ou menos insistência, mas ensina-se. A etiqueta não. Só um grupo restrito tem oportunidade de saber determinadas vertentes e, desse grupo, só outra parcela tem a possibilidade de as colocar em prática.
O “berço da etiqueta“, segundo a escritora, remonta aos séculos XVII e XVIII, brotado num ambiente aristocrático e de interdito acesso para a maioria da população. Esta ideia, demonstra de imediato que a etiqueta não é para todos mas, apenas para alguns. Da mesma forma que, este livro vasto em informação de âmbito aristocrático, não é destinado a todos, mas só para uma minoria elitista.
“A sociabilidade é algo de evolutivo“, refere a escritora. Sem dúvida alguma, que está coberta de razão mas, o que se modifica é o estilo de vida, o ligeiro desvio das normas de conduta e dos valores da sociedade.
A cultura não se perde. Não se esquece. O que se modifica no conceito de cultura, é que a mesma é influenciada por outras directrizes culturais, fazendo com que venha a expandir-se e a enriquecer. Porém, os valores primários, fruto desse conceito definido e inalterável, não desaparecem jamais. Foram eles, os pilares para o solidificar das nossas características culturais que identificam o nosso povo: um povo extremamente saudosista, agarrado às raízes do passado, dado ao romantismo, pioneiro nas descobertas marítimas, religioso, poeta. É assim, que bem ou mal, com ou sem regras de etiqueta, nos damos a conhecer na realidade.
Paula Bobone tem toda a razão, quando fala num aparecimento de novos registos culturais, que acabam por enriquecer a nossa esfera cultural. Enriquecer, mas nunca apagar o passado “culturalmente correcto”. Atenção, pois falo do enriquecimento do passado e não da tão badalada etiqueta.
A “falta de inteligência social“, não é a expressão mais indicada para aqueles que não cumprem as regras de conduta ou que adoptam um mau comportamento em sociedade. O que sucede é que os possíveis “transgressores do social“, não tiveram a oportunidade de aprender e interiorizar as normas e os valores da sociedade. Não se trata de “falta de inteligência“, pois a mesma nem sequer chegou a ser interiorizada, nem tão pouco a ser devidamente explorada. Só após uma experiência-teste o mesmo pode ser afirmado, e essa experiência em casos mais degradantes, está longe de ser concretizada.
O ensinar as crianças a comportarem-se socialmente é perfeitamente necessário, se não viveríamos perante uma total anarquia social, e as boas maneiras nem tão pouco seriam um vocábulo reconhecido. Mas, as boas maneiras e a educação inserem-se num prisma totalmente diferente da etiqueta, característica das altas classes sociais e, que neste livro é o fio condutor de todos os tópicos abordados.
“Socialmente Correcto”, de Paula Bobone, é um livro dotado de uma pesquisa exemplar, na arte do saber estar, receber, vestir, decorar, no fundo é um manual da arte de explorar e saber usar o verdadeiro requinte. A escritora realizou uma intensa pesquisa no âmbito das tradições e dos valores, que regiam a alta sociedade de outros tempos e isso, é algo de inegável.
È notável que o livro é dirigido a uma classe social elevada, interdita a muitas pessoas que nem imaginam que este tipo de conceitos existem. O elitismo deste “socialmente correcto”, proporciona em muitos cidadãos a curiosidade para a sua leitura. Colocar em prática as muitas situações que aqui são retratadas é algo, a que só alguns poderão aceder.
Paula Bobone escreveu este excelente livro, ignorando as classes menos destacadas financeiramente, mas fornecendo um impressionante guia para os mais badalados protagonistas do nosso Jet-set. O social é um conceito a que todos têm acesso e no qual estão inseridos. A cultura do nosso país é um “universo” criado para o nosso povo, desde as raízes mais antigas até à modernidade. Mas, aquilo que este livro aborda é um mundo restrito, longe da vista e dos hábitos de tantos portugueses. “Socialmente Correcto”, é este manual complicado onde o requinte se confunde com o social e, onde a boa educação veste a pele do saber estar requintadamente. O elitismo sobrepõe-se ao social e a classe ao saber.