Crónica: Tempo de férias

1988
Cronistas da MulherPortuguesa
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O tempo de férias chegou! Muito sol, alegria, passeio, viagens mas, como nem tudo é perfeito, surge sempre um problema: onde deixar a bicharada lá de casa? Levamo-los connosco?

Finalmente, já posso ir para a praia! Depois de um Inverno bem rigoroso (só eu sei os nervos que apanhei ao atravessar o Rio Tejo), eis que o sol espreita fortemente para iluminar as nossas vidas.

O pior são as filas de trânsito até chegarmos à praia, a falta de civismo das pessoas, as cenas parolas a que temos de assistir, para já não falar daquelas músicas muito ‘jeitosas’ destinadas, pura e simplesmente, a chamar a atenção. Enfim, cada um dá o espectáculo que quer, porque é mesmo assim. E quem sou eu para criticar!

Tempo de férias

A crónica desta semana não se prende propriamente com a conduta das pessoas ao se deslocarem para a praia, mas sim das companhias que levam. Certamente já lhe aconteceu estar muito bem na sua toalha e verificar que quatro patas, felpudas ou não, estão prestes a cair-lhe em cima.

E, também com toda a certeza, que nunca se escapou de ter acabado de sacudir a toalha e, segundos antes de se deitar nela, ver um animal canino atirar areia para cima da mesma. Assim, sem mais nem menos, como se fosse algo ‘caninamente correcto’.

A verdade é que os cães são muito bonitos, sim senhora. Mas, por acaso, já imaginou o que aconteceria se todas as pessoas levassem os cães para a praia?

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Automaticamente passaríamos a ter diversas zonas de recreio para cães por toda a costa portuguesa, sob o olhar atento dos seus encarregados (os donos, portanto). Ninguém é obrigado a ter que levar com um cão, completamente desconhecido, a mandar areia para cima (aqui está uma das coisas que me irritam profundamente!).

Eduque-o e depois leve-o para a praia, porque é óbvio que o animal também precisa de ar livre e espaço para se divertir. Porém, há que pensar nos outros, e não deixar o animal andar a desfilar de toalha em toalha, de forma airosa, como se fosse uma Claudia Schiffer, versão canina.

O facto de não ser muito aconselhável levar os animais para a praia quando estes não lhe têm o mínimo respeito, não implica que os deixe abandonados em casa, o dia inteiro, a suplicar por um pouco de ar livre.

Se você tem um animal em casa deve ser responsável por ele, independentemente se for um cão, gato, uma tartaruga, um canário, uns peixinhos, uma iguana (não façam essa cara porque já vi iguanas domésticas!).

Você deve ser sempre responsável por eles, dando-lhes carinho e conforto, e se não for capaz de lhes dar afecto o melhor é deixá-los estar no local onde os adquiriu.

Ter um animal, ou mais, em casa, implica responsabilidades que, infelizmente, nem todos possuem!

A época do Verão, altura em que muitas pessoas se ausentam da sua zona de residência, é o período no qual se constatam mais animais abandonados.

Sem qualquer piedade são abandonados, à mercê de um futuro incerto, no qual a estabilidade e segurança de outrora é colocada em causa. O que é que lhe custa quando for de férias deixá-los num daqueles hotéis para animais? Ou, quem sabe, deixá-los com um amigo que assegure o seu conforto?

Os sentimentos humanos são muito estranhos, mudam do dia para a noite, e aquele que há pouco tempo era o mais que tudo (o animal, entenda-se), passa de uma hora para a outra a ser um obstáculo para gozar o Verão. Afinal, o Algarve, Espanha ou Brasil, ‘esperam por nós e ter que estar a levar o cão ou o gato não parece muito boa ideia’.

Levá-los consigo para férias é complicado, eu reconheço, mas não os deixe abandonados. Acredite que os animais sentem bastante essa sua renúncia!

O ‘Tico’, a ‘Teka’, o ‘Tareco’, ou o ‘Putchi’ precisam tanto de um lar, amor, e carinho, como você! Imagine-se a viver em total harmonia e, de um momento para o outro, inexplicavelmente, sentir-se só, isolada, perdida.

Com toda a certeza já sentiu algum dia uma sensação semelhante, mas ser abandonado, no verdadeiro sentido da palavra, é uma sensação ímpar e indescritível e que, presumo, ninguém pretende passar por ela.

Chegou o momento e a hora de não pensar somente em si, e começar a encarar os animais com um pouco mais de respeito e dignidade.

Os tempos de férias para os animais não significa o seu abandono, mas sim o encontrar de alternativas para que eles fiquem bem e que, também eles, gozem de momentos bastante agradáveis.

Por isso, julgo eu, quando a pessoa não tem capacidade para ter um animal, seja ele qual for, é melhor estar quieta, no seu canto, a deliciar-se com os animais dos outros. Não tem problema algum não ter nenhum animal, e chega a ser preferível esta realidade do que, mais tarde, vir a desempenhar papéis de envergadura repugnante.

Agora faça-me um favor. Sim, a você que tem um cão. Eduque-o um pouco melhor, e tente não permitir que ele perturbe as outras pessoas. A primeira vez pode ter piada, mas a segunda pode habilitar-se a uma resposta mais torta.

Faz-me lembrar daquela vez que estava na praia com uma amiga minha, e ao meu lado encontrava-se uma rapariga, assim com pinta de jet set em último grau, com um cão, bem bonito por sinal.

O problema é que o cão não parava de andar em cima das pessoas e toalhas e, não sei porquê, tinha uma sublime adoração pela minha pessoa. Isto repetiu-se umas 7 ou 8 vezes, enquanto a dita rapariga apenas o chamava, como se estivesse no fundo de um poço, sem que ‘ele’ lhe ligasse nenhuma. Moral da história: como o tempo estava bera ela optou por se ir embora, mais o seu amigo canino.

É por estas e por outras que vos digo: quem não sabe, ou não tem condições para ter um cão, não o tenha! Não sei se é uma vocação, arte, ou uma boa dose de paciência, mas a verdade é que nem todos estão habilitados para cuidar de um animal.

É como tudo na vida: nem todos estão habilitados para cantar, jogar futebol, ou pertencer ao jet set (também é só fingir que se tem muito dinheiro, dizer que é descendente da nobreza ou da rainha não sei das quantas, e colocar-se diante da câmara sempre que sentir que o flash vai estoirar), ou mesmo para governar um país!

Bem, mas a conversa da governação fica para outra altura porque nesta crónica quem governa são mesmo os animais!

Cronista da Mulher portuguesa: Ana Amante

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