Nem sempre nos conseguimos recordar de tudo aquilo que dissemos. Por vezes pode haver lapsos de memória, mas nada comparado com o esquecimento brutal de um homem: Luís Miguel Militão.
Lapsos de memória
Estamos todos ainda recordados das cenas macabras a que assistimos o mês passado, nas estações de televisão, quando foram encontrados os seis corpos dos portugueses desaparecidos, até então, e enterrados ainda vivos no bar “Vela latina”, situado na Praia do Futuro, Fortaleza, Brasil.
As imagens a que o mundo assistiu não deixaram qualquer saudade, ou recordação de registo, mas apenas ódio e repulsa pelos responsáveis do crime: três seguranças, um cunhado da figura central de toda esta tragédia, todos brasileiros, e um homem, português, natural do Barreiro, que atraiu para as malhas da morte seis homens, cujo principal objectivo era ir passar umas férias ao Brasil.
Muito se tem falado sobre este caso que durante muito tempo foi destaque em Portugal, Brasil, e em tantos outros pontos.
Não me compete a mim, hoje, contar-vos esta história macabra com os pormenores sórdidos que o próprio Luís Miguel fez questão de contar, em directo e ao vivo, para todos aqueles que ainda conseguiam suportar a falsidade da sua voz, o cinismo das suas lágrimas, ou a hipocrisia do seu carácter.
O que me trás aqui, eu, entre tantas outras pessoas, que acompanhei este caso desde o primeiro momento, prende-se exactamente com a última novidade relativamente ao caso: a súbita amnésia de Luís Miguel Militão.
Após ter confirmado o crime, e contado passo a passo tudo o que tinha sucedido, assistiu-se ao impensável: Luís Miguel Militão diz não se lembrar de ir buscar os portugueses ao aeroporto, de estar com eles, nem tão pouco de conhecê-los.
Quando todos pensávamos que não poderia haver novidade alguma em relação a este caso, a verdade é que este homem, Luís Miguel Militão, tentou encontrar outra forma de escape. Afinal, o que sucedeu? Terá o criminoso comido demasiado queijo?
Será esta mais uma táctica para tentar disfarçar aquilo que é já sobejamente conhecido por todos? O cinismo humano irá tão longe ao ponto de sermos “obrigados” a assistir a uma sucessão de mentiras revoltantes como estas?
O crime de Fortaleza foi uma das maiores barbaridades de que temos memória nos últimos tempos. Um misto de actos brutais, sem escrúpulos, asquerosos, protagonizados por umas parcas dezenas de contos. Ódio atrás de ódio, repulsa atrás de repulsa, são os sentimentos que todos conservam em relação a Luís Miguel e aos seus aliados.
A tentativa de alegar insanidade mental, como se um louco pudesse engendrar um plano destes, parece ser um dos trunfos, ainda que sem qualquer fundamento, do mentor da tragédia. Mas, Luís Miguel não vai conseguir!
As provas reunidas, as suas declarações, a forma como, aparentemente, colaborou com as autoridades, revelando todo o tipo de pormenores daquela noite, não o vão deixar sair imune de tudo isto.
Não pode sair! Esta é a “nossa” vontade, minha e das restantes pessoas, ainda que a justiça não haja segundo as vontades, e nem sempre coloque à frente a veracidade dos factos, mas sim outros interesses! Todavia, aqui a verdade é mais forte do que qualquer falha de memória.
Mesmo passado algum tempo sobre este acontecimento ninguém esqueceu o ocorrido. É forte demais para que alguém o consiga esquecer! Numa cadeia do Brasil, Luís Miguel e Leonardo, um dos intervenientes do crime, tentaram fugir, em busca da salvação que não vai chegar.
Há ainda a realçar o facto de que no dia em que Luís Miguel foi presente a tribunal, juntamente com os restantes envolvidos, registaram-se cenas de pancadaria entre o procurador e o advogado de Jurandir, um dos capangas implícitos na morte dos seis portugueses.
A verdade é que todo este caso é uma sucessão de novidades atrás de novidades, nas quais as palavras dignidade e honestidade parecem não conseguir fazer valer o seu real valor.
Por vezes, em silêncio, dá a sensação que tudo isto não passa de um simples guião para um filme, nos quais os maus e os bons estão já previamente escolhidos à partida. A trama, desenrolando-se num cenário macabro, acabará sempre por anunciar o seu fim trágico, para mais tarde constatar-se que tudo não passou de um elenco de horror que ainda ninguém tinha tido a coragem de elaborar.
A diferença aqui é que o drama da Praia do Futuro, que nome tão pouco apropriado para a ocasião, não é apenas cinematográfico. Faz parte da realidade cinzenta a que todos os dias, de uma forma ou de outra, vamos sendo “obrigados” a assistir.
Um monstro, como alguns lhe chamaram, continua ainda a aparecer nos jornais e televisões, demonstrando toda a calma do mundo e afirmando não se recordar de nada, nem de conhecer as vítimas. Como é possível, pergunto eu, que a gratidão humana consiga transformar-se num caminho irreversível para a morte?
Luís Miguel é feito de quê? O que terá ele no lugar de coração? Um bocado de pedra ou de ferro? As suas atitudes revelam um mar de horrores: a dureza dos seus pensamentos, a chacina que se alojou na sua mente, a ganância pela posse de dinheiro, e a inexistência de sentimentos humanos.
Este homem não possui qualquer tipo de emoções positivas dentro dele, a não ser sentimentos egoístas, dignos de uma pessoa insensível, repugnante, que facilmente passa por cima de quem quer que seja para alcançar os seus objectivos. Prova disso é que passou por cima do seu melhor amigo, que era como um irmão para ele.
Não me posso igualmente esquecer dos quatro indivíduos que o acompanharam neste carrossel para a morte, indivíduos igualmente maquiavélicos que se preocuparam somente com o dinheiro que a morte de seis pessoas podia render. Que a justiça lance os seus tentáculos em redor deles, e lhes dê o futuro merecido!
O desfecho desta situação que envergonhou portugueses e brasileiros, e os feriu na sua alma e dignidade, parece estar ainda longe. Resta apenas que Luís Miguel Militão tenha um resto de honestidade dentro dele (será isso possível?), e de uma vez por todas assuma a responsabilidade dos factos perante a justiça.
Ao menos, assim, quem sabe, as almas do seis portugueses poderão descansar um pouco melhor! É que a verdade pode tardar em vir, mas quando chega não há lapso de memória algum que consiga assassiná-la!
Cronista da Mulher Portuguesa: Ana Amante