Escreveu sobre a sua Baía, e perfumou-a com o cheiro a cacau, cravo e canela. Capitão de Areia, deambulava no seu País do Carnaval, ao mesmo tempo que o mundo se rendia á sua escrita.
Jorge Amado partiu no dia 6 de Agosto de 2001. O romancista brasileiro mais traduzido e conhecido em todo o mundo nasceu em 1912, em Ferradas, atual município de Itabuna, Baía, entre uma plantação de cacau e Ilhéus.
Jorge Amado de Faria era o nome completo do homem que levou o seu país, e a Baía, além fronteiras. Filho de um comerciante que, mais tarde, se tornaria produtor de cacau, Jorge Amado teve sempre uma vida agitada. De jornalista boémio na década de 20, ao maior romancista brasileiro tempos depois, Jorge Amado foi sempre um símbolo do Brasil, levando a Baía até aos lugares mais longínquos do mundo.
Aos 19 anos, ainda muito novo, Jorge Amado levaria a todos o seu primeiro romance ‘O País do Carnaval’, a sua rampa de lançamento estudava Direito na altura, estávamos na década de 30, e Jorge Amado colaborava já em diversos jornais. ‘Cacau’ e ‘Suor’ seriam os romances que o levariam a solidificar ainda mais o seu trabalho, alcançando através deles uma sólida notoriedade.
As portas do sucesso abriam-se à sua passagem, e os aplausos no seio da literatura eram cada vez mais notórios. Assumindo-se como comunista, em determinada altura, o escritor assistiu à apreensão do livro ‘Cacau’. ‘Jubiabá’, ‘Capitães de Areia’, e ‘Seara Vermelha’, vinham confirmar, pouco tempo depois, a perseverança do escritor e a sede em denunciar a sociedade em seu redor.
Jorge Amado era a voz do povo, o grito dos mais desprotegidos, o eco amargo das injustiças a que o Brasil assistia. Chegou a ser deputado federal pelo Partido Comunista, mas abandonou essa posição quando o partido foi dado como ilegal. Esteve preso, exilado, percorreu países socialistas da Europa, e rompeu os laços com o Partido Comunista devido aos crimes verificados na União Soviética.
Era um homem justo, equilibrado, que através da literatura e transparência das suas obras levava ao mundo o outro lado da Baía, muito além do deslumbramento das roças de cacau, do paradisíaco das praias, do samba e Carnaval.
Jornalista, romancista, cronista, licenciado em Direito, fundou várias publicações, e colaborou em diversos órgãos de imprensa. Jorge Amado deu a conhecer aos seus leitores a vida amargurada do pobre, a perseguição ao negro, a desgraça do trabalhador, nas zonas de cacau e urbanas da Baía, os comportamentos sociais mais marcantes do nordeste, construindo verdadeiras heroínas até hoje relembradas.
Pintou num único quadro as cores do romantismo e realismo, vestiu as suas palavras de um lirismo poético muito especial. Invocava sempre o nordeste brasileiro, mas sentia-se em cada descrição o doce toque revolucionário, misturado com a dádiva sublime do carinho que nutria por aquelas gentes.
Desse carácter revolucionário, único, indescritível, Jorge Amado, o escritor brasileiro mais traduzido de todo o sempre, entregou-se a partir da década de 50 a um estilo mais social, popular, irónico. Dava vida a figuras e personagens alusivas à sociedade baiana, para depois as brindar com o perfume das paisagens e cidades nordestinas. ‘Gabriela, Cravo e Canela’, em 1958, foi o arranque dessa nova filosofia literária, repleta de personagens malandros e bufões, seguindo-se outros títulos como ‘Dona Flor e seus dois maridos’, ou’ Tieta do Agreste’.
Todos eles grandes êxitos enquanto livros, mas também líderes de audiência quando ocorreu a sua adaptação para telenovela. A adaptação à televisão e a subida aos palcos de teatro foram uma constante nas obras do romancista.
A longa extensão de títulos de Jorge Amado podem ser divididas em três grandes capítulos, quase como se de uma telenovela se tratasse: iniciando a sua obra sob o cenário da Baia, a luta entre ricos e pobres, as injustiças sociais, o mundo da opressão, com alguns traços políticos, Jorge Amado continuaria a denunciar as parcas condições dos pobres, trabalhadores, mas com um cenário especial: as fazendas de cacau, e a exploração dos seus trabalhadores. ‘Cacau’ é o perfeito exemplo deste cenário literário.
É esta obra a que foi considerado pela crítica o melhor romance de Jorge Amado. Do cheiro sedutor do cacau, o escritor passaria a escrever sobre comportamentos sociais, criando personagens padrão fortes, recorrendo, uma vez mais, à Baía como pando de fundo. Histórias de malandros, vagabundos, heróis, românticos, acomodam-se nas páginas das suas obras, e irrompem grandes heroínas dos seus livros como ‘Dona Flor’, em ‘Dona Flor e seus dois maridos’, ou ‘Tieta’, em ‘Tieta do Agreste’
Falar de Jorge Amado é relembrar o homem que a 6 de Agosto deixou a literatura e o mundo para todo o sempre. Tarefa difícil será dizer qual foi seu melhor livro, pois todos eles carregam no ventre uma qualidade literária inequívoca.
Para sempre referência serão títulos como ‘Gabriela, Cravo e Canela’, ‘Capitães de Areia’ ou ‘Mar Morto’, tornados famosos pela mão daquele que tão bem conhecia a alma baiana e do Brasil. O mundo chorou a sua morte, a Academia Brasileira de Letras, da qual era membro, também, mas as palavras daquele que foi a maior referência literária do Brasil jamais se silenciarão. O seu mérito será eterno! Até sempre, Capitão de Areia!