De bolsos vazios no Algarve

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O primeiro-ministro António Guterres deve andar a transbordar de amor e, por isso, não analisa com precisão a economia portuguesa. Ou será o Algarve uma estância de luxo e ninguém sabia?

As declarações do primeiro ministro António Guterres dão vontade de rir até à pessoa mais leiga do país. Mas, infelizmente, dão também uma enorme revolta, porque essas declarações vêm precisamente de uma das pessoas que contribuiu para que a situação chegasse a este ponto. E, dizia ele, algures, que a deslocação em massa dos portugueses para o Algarve, nesta Páscoa, revelava que não existiam problemas graves na economia portuguesa. Não é profundo e irritantemente absurdo?

Eu, de facto, já tinha ouvido dizer que o amor faz destas coisas às pessoas. Distinguir a realidade da ilusão torna-se difícil, só se tem olhos para a pessoa amada (Catarina, meu amor!) e entra-se num estado de transe tal, para o qual é muito difícil acordar para a realidade. Mas o Eng. António Guterres tem que acordar de vez, até porque é ele que tem a posse dos números, as dívidas e as despesas, os lucros, e tudo o mais que tenha a ver com a economia nacional. Nós, ‘pobres ricos’, não temos nada, a não ser, claro, o lugar reservado num aldeamento de luxo no Algarve!

Recordo-me de ir para o Algarve quando era miúda e, mais tarde, por altura da adolescência, mas nunca consegui encarar o Algarve como uma estância de luxo, somente para os ricos e para aqueles que nadam em notas de 10.000$00. Havia, e há, de tudo um pouco. Desde apartamentos, hotéis e vivendas a preços exorbitantes, até a locais bem mais em conta, próprios para uma família da classe média. E, se uma simples viagem ao Algarve demonstra o saldo bancário de alguém, então deixem-me que vos diga que o meu está mesmo muito mal, porque não vou ao Algarve há uns bons anos!

Esquece-se o Eng. António Guterres que o Algarve não é só turismo. Existem famílias a viverem lá e que, por sua vez, têm familiares em outras zonas do país. Portanto, e eu explico isto como se a pessoa a quem esta crónica da má língua se dirige tivesse cinco anos, é perfeitamente normal que as pessoas se desloquem até lá para visitarem os familiares. E isso demonstra o quê? Que vivem bem, sem terem que contar os trocos para pagarem as contas? Será ir a uma praia do Algarve um acto de luxo? Claro que existem zonas do Algarve tipicamente turísticas, mas isso não implica que as pessoas que para lá se deslocam vão exclusivamente para um desses aldeamentos.

O Eng. António Guterres, que certamente é uma pessoa que vive bem, bem melhor até que mais a maioria das pessoas que foi para o Algarve nesta Páscoa, é que devia ir também para lá, demonstrar exactamente que a sua situação económica pessoal não apresenta problemas graves. Ou será Marrocos o sinónimo de uma outra elite? Até porque, e caso não saiba (se calhar não sabe porque não se dá com o povo), o Algarve é popularmente conhecido pelo ‘passeio dos pobres’. A falta de dinheiro, ou a não demasia dele, obriga-nos mesmo a ficar por cá, e no Algarve, ilusoriamente, encontra-se tudo, ou quase tudo, o que se pode encontrar em Espanha, no Brasil, México, República Dominicana: praia, sol, diversão e boa comida (a nossa é bem melhor que todas as outras, mas pronto!).

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Se a ida para o Algarve nesta Páscoa é demonstrativa da inexistência de problemas graves na nossa economia, então talvez possamos todos fazer uma grande excursão para lá um dia destes: os ministros e os comuns cidadãos todos juntos. Ia ser bem exemplificativo de como estamos de ‘massas’: nós a comprarmos uma ou outra recordação, e os ministros a comprarem as lojas quase inteiras; nós a almoçarmos numa daquelas casas de fast food, e os ministros a deliciarem-se com sapateiras e outros ‘bichos’ desta espécie; nós a ficarmos num hotel de *** estrelas, e os ministros num daqueles aldeamentos de luxo onde só falta darem o comer à boca, e outras coisas mais que agora ficam aqui mal dizer. Sim, porque esta é a realidade de grande parte da nossa população, caso o primeiro ministro e todos os outros membros do governo não saibam.

A observação de Guterres foi deveras desnecessária, e ainda para mais proveniente da pessoa que melhor sabe o estado da economia portuguesa. Fica-lhe mal a ele, degrada a sua imagem, e só serve para que os portugueses critiquem ainda mais a sua já tão criticada governação. Só espero é que António Guterres saiba levar melhor o seu casamento do que tem vindo a levar a conduta de Portugal! Mas como o amor é lindo, acredito que tudo vá correr bem para ele! Não se esqueça é dos portugueses, que com mais ou menos consciência, o colocaram no poder!

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