Como é possível que aqueles que apregoam a fé, castidade, honestidade, protagonizem actos repugnantes, asquerosos, como os praticados por um padre francês? Serão os abusos sexuais um fetiche da Igreja?
Os valores da igreja
As notícias trazidas recentemente a público, que levaram à condenação de um bispo francês, Bayeux-Lisieux, por não ter denunciado os actos pedófilos exercidos por um padre da sua paróquia, são bem mais complexas do que aquilo que possamos pensar.
Em primeiro lugar, não se trata de um tarado qualquer, julgo eu; em segundo lugar, este homem que praticou os abusos, René Bissey, é um representante da Igreja; em terceiro lugar, parece que nem na casa de Deus as crianças podem estar a salvo.
Apesar de serem altamente condenatórias as condutas dos pedófilos, parece-me a mim que, neste caso particular, a situação ganha uma dupla complexidade e repugnância por se tratar de um dos defensores da moral.
Respeito todas as pessoas. Não só aquelas que vivem em função da fé, seguindo os conselhos silenciosos de um Deus universalmente consagrado, como aquelas que estão completamente vazias de valores religiosos, e que não se interessam por estas matérias.
No entanto, e para qualquer destas pessoas, devia ser aplicada pena máxima quando se trata de casos de pedofilia, independentemente do estatuto e posição que ocupam, bem como da ideologia que consideram como viável.
A lei é para todos, a justiça não pode ser cega, ou fazer distinções, e trabalhadores rurais, funcionários públicos, engenheiros ou padres devem acartar, sem que haja aqui o peso do estatuto, exactamente com a mesma pena.
Só que, qualquer um destes homens não apregoa os valores morais, não recomenda que se siga as pegadas do Senhor, não condena o aborto (isso devia ser uma decisão pessoal), reconhece a importância do uso do preservativo, e não está nas suas mãos ‘condena’ com não-sei-quantos “pais nossos e aves marias” alguém, porque houve uma traição ou uma mentira mais maldosa.
Á excepção de um! Há um daqueles homens, entre o trabalhador rural, o funcionário público, o engenheiro, e o padre, que o pode fazer: o representante da Igreja.
Tem poder e autoridade moral para isso! Mas, e se possui tamanhas qualidades, como pode ele protagonizar abusos sexuais?
Como pode também, desculpem-me a insistência, o representante de Deus calar a sua voz para camuflar os erros de um seu semelhante?
Não é normal que nos últimos tempos tenhamos vindo a registar, um pouco por todo o mundo, casos de padres responsáveis por abusos sexuais a crianças.
O único lugar, entidade, homem, no qual as pessoas confiam tornou-se mais uma ameaça para esta selva urbana mundial! E agora fazemos o quê a seguir? Os fiéis não pedem justiça?
Os restantes padres não vêm agora à televisão criticar esses actos, como quando se trata de outras causas referentes à raça humana, como o aborto ou o uso de preservativo?
Onde estão os valores da Igreja? Perderam-se no tempo, ou em algum recalcamento sexual que agora se pratica da forma mais asquerosa?
Falar-me-ão agora do segredo profissional de determinadas profissões. Claro! Então daí posso concluir que, se um assassino matar dezenas de pessoas, violar outras tantas, e for contar a um padre, isso fica em segredo de confissão, mesmo este sabendo que a chacina pode continuar e daí provirem mais não-sei-quantas vítimas?
Caramba! Ou mudam os princípios do segredo da confissão, ou então serão cúmplices de actos pecaminosos! E então teremos que pensar onde fica a fronteira entre o correcto e o errado, entre o pecado e a moral!
Julgo que é condenável que os padres, ou qualquer outra pessoa, pratiquem actos de pedofilia, mas é ainda mais repugnante se pensarmos que são estes os representantes da moral, os que apelam à boa conduta, e que dizem lutar pela união dos seres humanos.
Revoltam-me este tipo de situações! Estamos aqui a falar de homens, e este caso de pedofilia não é o primeiro, nem será o último descoberto no seio da Igreja, e não propriamente de pessoas imunes a qualquer género de justiça.
Como todo e qualquer ser humano têm direito a errar, a enveredar por filosofias de vida condenáveis, a cometer pecados.
Contudo, se a vocação não consegue superar os seus pensamentos maléficos, se a dignidade e integridade humana não é mais elevada do que uma perversão sexual, então abandonem as suas posições na família cristã e parem de semear falsidades oratórias!
Afinal, é nas atitudes de um homem que a real personalidade transparece, e a destes pedófilos, representantes da Igreja ou não, é vulgar e miserável demais para merecer o perdão de quem quer que seja!
Casos como este, em que um padre cometeu abusos sexuais a crianças, choca qualquer cidadão, qualquer paróquia mais longínqua. Revejam-se os princípios morais, as bases nas quais assenta o segredo de confissão, a real vocação antes de anuir ser um representante de Deus.
Pelo facto de o serem, têm uma responsabilidade acrescida para com a comunidade que os rodeia, mas essa responsabilidade é regida pela protecção, aconselhamento moral, pela conduta das boas práticas e dos pensamentos louváveis, e não por actos deste teor.
Parece estar provado que ser-se padre não implica possuir aquilo de mais belo o homem possui: a dignidade e integridade humana. Encontramo-la facilmente num cidadão vulgar, comum, mas não necessariamente num pároco.
Séculos depois, a magnificência e honra da Igreja está a ser posta em causa, exactamente por actos que os representantes de Deus consideram ser pecado: sexo. Parece, por isso, que o pecado, na sua forma mais vil, mora na casa de Deus!
Cronista da Mulher Portuguesa: Ana Amante