Isabel do Carmo fala de anorexia

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Anorexia
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Todas as adolescentes já passaram pela fase da mania das dietas. Mas umas sofreram mais do que outras… Acerca da anorexia nervosa, falámos com a Dr. Isabel do Carmo, do serviço de Endocrinologia do Hospital de St. Maria em Lisboa.

Como é que se sabe se uma jovem sofre ou não de anorexia nervosa?

A anorética é uma jovem – e eu digo uma jovem porque geralmente são pessoas jovens do sexo feminino – que, voluntariamente, deixa de comer o suficiente. Ela, de facto, não tem falta de apetite mas impõe-se a si mesma uma restrição alimentar. Em consequência disso, perde peso (pelo menos 15% para ser considerado como anorexia). Esta desnutrição reflecte-se no resto do organismo: perda de cabelo, atrofia muscular, magreza acentuada, debilidade, falta de menstruação. Esta rapariga, apesar de ter uma aparência tão magra, vê-se a si própria como tendo excesso de peso – há uma deformação da imagem do corpo que é característica destas situações.

Mas este não é o único distúrbio alimentar. Como se distingue a anorexia da bulimia?

É uma situação diferente. A bulímica é uma rapariga com peso normal que tem grandes períodos de restrição, seguidos de compulsões alimentares. Estes ataques de gula são, depois, geralmente seguidos de manobras compensatórias como o vómito.

Então pode haver casos de jovens com anorexia e com bulimia ao mesmo tempo.

Sim, pode haver uma doente com anorexia nervosa que tenha compulsões alimentares e que induça o vómito mas, neste caso, se tiver anorexia, é uma pessoa muito magra.

Quais os sintomas mais evidentes da anorexia?

Começar a comer muito pouco, ter manias alimentares, a perda de peso e deixar de ser menstruada – tem de ter pelo menos 3 meses sem menstruação para ser considerada como anorética.

Quando falamos de anorexia, falamos então de uma doença meramente psicológica.

Sim, é uma doença psicológica. Não é uma doença física, tanto quanto se pode separar o físico do psicológico.

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E o tratamento como é que se processa? Demora muito tempo?

É, acima de tudo, um tratamento psíquico. Às vezes as pessoas pensam que é só um problema de dieta e de alimentação mas isto é, apenas, uma consequência. Tem que ser uma psicoterapia. Quanto ao tempo de tratamento, ele varia muito mas, em geral, é longo. Pode demorar meses, anos… É uma doença que leva muito tempo a instalar-se e que, depois, demora muito tempo a passar. Não é de um momento para o outro.

A anorexia marca muito a pessoa. Que implicações pode ter no futuro?

Há pessoas que ficam completamente bem, enquanto que há outras que ficam com problemas, essencialmente, ao nível dos ossos. O problema principal ao nível físico é a osteoperose. Ainda estamos para saber se será definitivo ou não, porque os aparelhos de osteoperose – para medir a intensidade dos ossos – são relativamente recentes e os estudos nas anoréticas também. Por isso, ainda não sabemos se, a longo prazo, estas raparigas ficam curadas ou não. É difícil responder.

E o mesmo se passa a nível psicológico.

Sim, se há doentes que recuperam bem, outras há em que a doença deixa alguns traços para o resto da vida.

Aonde e a quem se podem dirigir estas jovens ou os seus familiares?

Temos 3 consultas: uma no Porto, no Hospital de S. João, outra em Coimbra, no Hospital da Universidade e aqui em St. Maria. Mas, é preciso que se diga, estamos neste momento em situação de saturação, com falta de técnicos. Existem casos de risco outros mais ligeiros que podiam receber o apoio do médico de família, aliviando o nosso serviço. Estamos mesmo sem técnicos no hospital e não temos nem psicólogos nem psiquiatras e esta ajuda seria preciosa.

O principal grupo de risco são as jovens adolescentes. Haverá alguma razão para o elevado número de raparigas que sofrem de anorexia e para o número reduzido de doentes do sexo masculino?

Não há nenhuma explicação que nos diga, com toda a certeza, porque são as raparigas as principais vítimas. Biologicamente as raparigas são diferentes dos rapazes, a relação rapariga/ mãe também é diferente e o mesmo se passa com o ambiente social. O que é certo é que, segundo as estatísticas, só há 1 rapaz para cada 10 raparigas a sofrer desta doença.

Culpa-se muito a moda por exercer pressão sobre as jovens. As imagens das top models enchem as revistas, os ecrans da televisão…

Existe, de facto, pressão no sentido da magreza, das pessoas serem magras e de terem um peso inferior ao seu peso saudável. Este é um dos factores, mas não é o único.

Então é uma doença do nosso século?

Não, é uma doença de longa data. Há casos datados desde o século XIV, muito ligados aos excedismos religiosos. A St. Catarina de Siena é um caso clássico.

O papel da escola e da família na prevenção desta doença é muito importante.

Sim, informando… Sobretudo informando que, no período da adolescência, as pessoas crescem em altura e em largura e que os tecidos do corpo necessitam de alimento para esse crescimento. Parece óbvio mas, nem sempre, a mensagem passa. Há que fazer saber aos jovens que eles precisam de carne, de peixe, de leite, de fruta, de pão, de massa ou de arroz para serem saudáveis.

Acha que a escola e a sociedade têm passado esta mensagem?

A escola tem estado muito desperta para estas coisas. Os programas falam muito neste problema e os professores, de um modo geral, estão despertos para estas situações. A sociedade em geral também. Eu penso que, neste momento, a informação circula muito bem.

Existem números concretos quanto aos casos de anorexia em Portugal?

Nas escolas secundárias, num estudo que fizemos nos distritos de Lisboa e de Setúbal, há uma rapariga em cada 200 com anorexia. Bulímicas são mais: 3 em cada 100 na população universitária. No Porto, os números são semelhantes. Falta-nos números a nível nacional mas parece que o Departamento de Psicologia da Universidade de Braga está a fazer um estudo neste âmbito.

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